A primeira vez que entrei em
contato com Paulo Freire, foi quando me aproximei da assessoria jurídica
popular. Havia lido um livrinho dele, chamado "Pedagogia da Autonomia", que havia
comprado no Salão do Livro do Piauí, ainda em seus primeiros anos, no início
dos anos 2000.
Começar a ler a obra, acompanhar
as discussões sobre e, principalmente, ver o esforço da prática do que ele
propunha, certamente foi uma das minhas mais preciosas experiências. Tanto
pelas amizades que se construíram nesse processo (por meio das redes e
presencialmente), quanto pelo contato com os movimentos sociais, a partir de
uma tentativa de tornar a discussão em torno do direito mais horizontal- algo
que eu intuía sofrivelmente ser possível, mas que o curso, dentro do formato
tradicional, nunca me apresentou. Um outro motivo de eu considerar essa
experiência, essas leituras e conversas e discussões, foi o exercício didático
de ouvir a outra e o outro, a compreensão do porquê, antes de tudo, é preciso
haver um processo prévio e depois contínuo de auto-crítica para aquela ou
aquele que se dispõem a ser professorxs.
E muito me surpreendeu a
ignorância das pessoas que lidam com a educação a respeito da proposta
freireana. Fiquei pensando que a contra-propaganda da ditadura de 1964 vem
sendo tão eficiente em nosso tempo, quanto foi na época- o que a falta de um
mergulho crítico nas nossas instituições não faz, não é?
Falo sem nenhum medo de parecer
arrogante. Dizer que Paulo Freire desconsidera as diferenças entre os saberes,
por ele defender o diálogo, a horizontalização das relações de todas as pessoas
envolvidas no ambiente educacional é só um dos muitos absurdos preocupantes
sobre a práxis proposta pelo educador. E me deixa triste ouvir isso de pessoas
que deveriam conhece-lo.
Da minha parte, penso que Paulo
Freire é genial. Mas penso que um outro engano pode ser cometido por um outro grupo,
dos entusiastas de Paulo Freire. Por acreditar que o diálogo, a dialogicidade é
o melhor caminho para a educação, muitos ignoram o que mencionei antes: o
pronfundo processo contínuo de auto-crítica e eu diria, de conhecimento de si,
diante daquele saber que vai ser apresentado às turmas e diante dos muitos
saberes que viram desses estudantes. Note que estou falando de uma sala de aula
formal.
Aplicar a horizontalidade sem
auto crítica dentro de uma instituição oficial, comumente marcada pela
hierarquia, é uma prática tão danosa quanto o que se quer desconstruir. Isso
porque, é claro que a professora, o professor, possui o domínio de um tipo de
saber que é justamente o valorizado por aquela área do conhecimento. Um domínio
que vai criar uma superioridade, uma hierarquia em termos perigosos quando se
embaça as fronteiras da relação professor/a-estudante dentro de um discurso que
afirma que somos todos iguais, estamos praticando a horizontalidade, quando na
verdade o conteúdo é predeterminado, estudantes não possuem nenhum poder de
decisão, o saber válido é aquele da comunidade de especialistas que a
professora e o professor já faz parte e que xs estudantes são estimulados a
entrar, ao abandono de outros tipos de saberes relevantes (sem compreender, ao
certo, porque deveriam realizar esse abandono).
Por isso uma parte de mim sempre
ficava receosa de praticar algumas das sugestões freireanas em sala de aula.
Com o tempo, passei, sempre de antemão, avisar as turmas de que ele era uma das
minhas maiores inspirações teóricas, mas que dentro do contexto institucional
vigente, eu ainda achava muito difícil praticá-la, sem cair na ilusão de
horizontalidade e terminar enganando a mim e a eles e a elas. Então eu só o
fazia por meio de algumas brechas antevistas ou descobertas nas trocas com as
turmas no decorrer das aulas.
Eu ainda nutro o sonho de um dia
conseguir encontrar (ou reencontrar) um grupo para estuda-lo/praticá-lo, porque,
bom, tá implícito no meu texto e explícito no Paulo Freire, que tudo isso
pressupõe mais de uma pessoa, um complexo de relações humanas.
Viva a Educação Popular!
ResponderExcluirVivaa!!!! \o/
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