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segunda-feira, 10 de junho de 2024

Humor Myiazakiano


Não sei quem mais faz barulho: a máquina revirando o concreto lá fora ou o cio dos pardais escandalosos no meu quintal.

 

O cio é força mais potente que máquinas humanas, mesmo que vindo das menores criaturas!


É o grito de guerra da vida! Ou grito de vida da vida!

 

Afasto-me de ambos: um porque me irrita, o outro, porque me constrange o coito alheio. Não tenho talento para voyer. Pode chamar-me de velha, só peço que seja gentil ao evitar mencioná-lo na minha frente.


Baseado em "Castelo no céu"- arte de Celine Kim


sábado, 9 de setembro de 2023

poema do dia

Esperança - Microcentrum rhombifolium


a nuvem


não adianta insistir com sua nebulosa história

não me preocupo com os desejos dos Gafanhotos

satisfeita, entrego minha dádiva preferida a

uma Esperança que salvei dos (seus) perdigotos

e se o verde resistir

tenho para mim a maior vitória.

quarta-feira, 7 de junho de 2023

página do diário: as morsas

 

ícaro do chagall

Aqueles corpos imenso caindo do céu, não eram bailarinas, nem anjos, eram bebês e meus irmãos, que não sabiam que suas decisões não estavam mais mediadas por um deus bondoso, com presas imensas e muito tecido adiposo, mas sim por um vazio conjurado por uma entidade maléfica, despertada pelo mais egoísta dos seres: o homem branco capitalista que apostou tudo no petróleo 50 anos atrás, convencendo a sua própria espécie por bem ou por mal. (Sobre a queda das morsas)  


domingo, 17 de outubro de 2021

ipepoca- em construção

Ipê branco florido não calçada de uma casa grande
foto tirada pela amiga Jeany


                                                     Pequeno ipê

Pipoca estourada

Perto do seu apê.

 

Pequeno ipepoca

Pede pipoca

Vai de doce ou salgada?


Ipepoca, fabuloso dente-de-leão,

boca gigante

te assopra.

 

Ipê encanecido

esmago com os pé

os seus brancos cabelos caídos.


[e segue o cardápio]

Ipê florido

Cuscuz de arroz

Ou cuscuz de milho?





Para a Malú e para a Jeany.

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Fim da estação de chuvas

O equívoco das derradeiras águas

Esse ventriloquismo do teu peito

afoga

numa poça

meu frágil ventrículo 

zumbindo por nada.



uma imagem em preto e branco de um balão cheio de água até a metade com uns peixinhos
Eu perdi a autoria da imagem


sexta-feira, 12 de março de 2021

Geografia



o castelo animado flutuando entre as nuvens
Imagem da animação "O castelo animado" dos Estúdios Ghibli











Eu costumava brincar de me esconder no pátio daquele castelo

Naquela montanha 

Eu sentia falta de grandes elevações 

vivendo nessa planície infinita

que convida facilmente ao tédio.


Então eu recorria às nuvens 

Elas reorganizavam a minha paisagem davam novos andares ao meu mundo-

chato e quente! 

Lá tudo era mais fresco e a chama eterna que me habitava podia enfim arder tranquila...

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

onipresente

eu lembro de um dia, em que pude escapar de uma recém instaurada rotina

em que mergulhei num mar gelado e fiquei boiando no raso

não tinha ninguém na praia

só um pescador bem longe

eu olhava o céu e sentia o mar imenso oceano

eu tocava as geleiras ao sul

o continente distante ao alcance da minha mão esquerda

outro roçando meus frios pés

eu era a fina liga que unia

céuemar

eu era imensa e leve e total

 

homem pescando no mar- foto alterada- eu sou a autora

 


terça-feira, 10 de novembro de 2020

infértil


O vento árido

O vento quente e seco

que espanta as gentes

e resseca a pele

arrasta no límpido azul

uma borboleta de asas amarelas

um vovozinho flutuante

e só

quarta-feira, 15 de julho de 2020

O iceberg fala

Eu sou meu próprio iceberg que se desprendeu de um continente, outrora mais gelado, mas ainda assim mais gelado que o derretimento flutuante no qual me encontro.


Eu necessito que você preencha essas lacunas que vou deixando entre um porto e outro, entre um ponto e outro, entre um poema e outro pois 


não sei tudo de mim. Sei algumas coisas. Sei que me sentia inteiro e eterno. A verdade é que não me dei conta de muitas coisas dos últimos 10 mil anos que vocês contam. Nos últimos 200 talvez. Quando dei por mim, estava perdendo minha imensidão e eu que era um me tornei dois, talvez mais.


Agora que me dissolvo, compreendo o medo. Não o meu medo de iceberg, mas o medo desses seres que de tão efêmeros, precisaram se convencer de que não, não eram. Pensando bem, talvez agora eu compreenda que eu também tenho medo. 


No entanto, eu precisava dizer-lhes para não ter medo. Estou aqui há tempo suficiente e posso assegurar que é muito melhor dançar essa dança junto assim da vida, do mundo, dos seres vivos e não vivos. Esse medo que agora reconheço, ele senta numa cadeirinha do lado e só aparece quando é extremamente necessário: levar uma bronca em casa por demorar no campeonato de pipa, saber que ele não gosta tanto de você, a avozinha morrer no tempo dela, sem que dê tempo que te conte a última história de uma infância distante. Esse medo. O medo de não ser eterno ou, o mais curioso, curioso para mim que fui montanha e ainda sou montanha, uma flutuante, o medo que sente algo que é tão pequeno e frágil e gostável até, um medo que vem porque cismou em ser poderoso. Não me leve a mal. Estou ainda tentando entender. 


Parece que esse será o meu destino: passar para a próxima fase. Será que é tão difícil, companheiros de dança, aceitar a sua próxima fase? Eu água salgada, vocês, chão, substrato, nós material para outras vidas e não vidas. Faz tempo que eu não passo pelas fases, muito tempo, mas disso eu lembro bem. Algo me diz que você deveria se preocupar com isso, do jeito certo. Mas quanto ao medo de perder o poder, confia em mim, que agora derreto, não há o que temer.



segunda-feira, 29 de junho de 2020

mitologia arrancada de um fim de tarde (e de um tuíte)

o corpo de um deus tem um amplo espectro de células
com diferentes tamanhos,
mas se você procurar pela maior e pela menor delas,
seus melhores exemplares constituirão a pipa e o sol,
cujas respectivas proporções relativas
são verdadeiramente notáveis
por isso, é justo afirmar
que a poeta faz seu registro com acurácia:

"hoje eu vi uma pipa
fecundando o pôr-do-sol"



terça-feira, 19 de maio de 2020

Meditação sobre o cogumelo azul





Há um cogumelo azul em algum lugar da Índia e da Nova Zelândia. Imagine só a beleza que deve ser esperar o branco e ver outra cor no lugar. O branco é uma cor, ele só não sabe disso. Será que o cogumelo azul ainda é um cogumelo? Ou será que seu brilhante pigmento o transmutou em algo outro? Embaixo, suas membranas suaves ressoam um tom avermelhado, como seus esporos. Azul e vermelho sobre o tapete verde de musgo e árvore com casca podre. Podre pra nós. Pra eles, isso é banquete. No meu quintal, os fungos são brancos, mas apreciam troncos caídos e velhos arbustos, como seus parentes indianos. Será que se sabem brasileiros ou indianos ou neozelandeses? Ou só cogumelos, seres saprófagos, de existência muito além dos chapéus coloridos, que eu aprecio? Eles se sabem muito além da ciência humana, pois têm a sua própria. Seus micélio, suas raizes, seu corpo, podem se estender discretamente por quilômetros, sem que outras espécies se deem conta. E são de muitas cores, conforme descobri hoje novamente e há 15 anos e há 28 anos.


segunda-feira, 20 de abril de 2020

Nota a respeito da delicadeza

É incrível que, num mundo extremamente duro, seres delicadíssimos persistam!



asa de borboleta em bolso translúcido de agenda

sexta-feira, 20 de março de 2020

Copernicia prunifera

Sabe como um pé de carnaúba cresce?
Como se junta aos outros irmãos e irmãs
Para compor uma paisagem
Altaneiro e coroado
Habitando os campos?

Diz-se que à noite
Num céu sem lua e anuviado
Uma mão gigantesca, grossa pele, puxa-lhe pelos cabelos
de uma vez só! Copernicia prunifera!

Ocorre que, às vezes, o espécime é tímido...
Ou teimoso...
e esperneia debaixo da terra, fincando mais fundo as fasciculadas raízes...
e consegue mais uns dias enfurnado
e, então, você vê: só parte do tronco, uma coroa quebrada, as folhas meio enterradas
o que já intrigou mais de uma trupe de viajantes

pelas bandas de Campo Maior.



 Destacam-se carnaubeiras e uma silhueta que se banha num rio 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Riacho de fevereiro

Você vem pelas bandas da federal em fevereiro e não sente cheiro de chuva não!
Sente é cheiro de riacho corrente 
Trovoadas  
O Olfato, órgão que captura o espírito da água
Rende-me às portas abertas do etéreo
Onde Gilliat há muito me espera...

Rolinha sangue de boi pousada na fiação, contra um fundo de nuvens escuras, de chuva.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Conversa com Blake

Toda noite e toda manhã
Algo de miserável nasce bom
Cada manhã e cada noite
Algo de bom nasce da doce pernoite
Algo de bom que nasce da eterna noite*



*Tradução adaptada e alterada de propósito, como é de praxe aqui.

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

A lição do milho no vaso

Mais ou menos no meio desse ano, recebi em casa uns cartões com receitas que eu havia pedido no site da minha amiga Carla, criadora do blog Outra Cozinha, que fala de plantas comestíveis não convencionais e de um viver mais simples e não violento. Junto com os cartões, a Carlinha colocou umas sementes de milho preto de pipoca. Eu nunca tinha ouvido falar de um milho preto de pipoca e fiquei muito contente. Já sabia que existiam muitos tipo de milhos, mas não havia me permitido imaginar que cada um fosse melhor para essa ou aquela comida. Isso me lembrou dessa bela foto de batatas peruanas em sua diversidade, que suspeito tenha sido até maior um dia.



Batata, assim como milho, são desses alimentos base, quase unanimidade entre as populações descendentes de ameríndios e mundo afora. Mas como o milho, a batata também foi standartizada, homogeneizada na figura de um único tipo, ou dois únicos tipos, a inglesa e a doce. Imagina aí a perda nutritiva e cultural. Quanta comida e quantas histórias essas cores dessas batatas carregam, como as dos meus grãos de milho preto?

Grãos do milhinho e a letra da Carla ^^


Daí que plantei alguns grãos num vaso grande do quintal da minha mãe. Dia 14 de agosto, deixei registrado na agenda/planner. Do tempo que passou até aqui, em meio a um br-ó-bró daqueles, que é um sol de rachar por meses a fio, bem difícil das plantas que não sejam cactos ou árvores de raízes bem profundas prosperarem, insisti no plantio do milho. Ele de fato cresceu, o que nos deixou muito maravilhadas aqui em casa, porque nunca tínhamos visto milho dando em vaso. 

Quatro meses depois, contamos cerca de 10 espigas, algumas geminadas (milhos gêmeos). O que era bem louco, porque era uma única plantinha, com um monte de milhinho nascendo. Mesmo com o adubo sendo constantemente renovado, a bichinha não conseguiu encher o suficiente as sementes, nem alcançar a sua tonalidade característica.  No entanto, eu considero a experiência desse plantio muito bem sucedida. Fiz sem esperar muita coisa e terminei tendo uma vivência de espera, de paciência, de frustração, de embevecimento ao longo desses meses. A Carla fala um pouco disso ao longo dos textos que ela compartilha. A finalidade não era comer um milho e apenas isso. Todo o processo acrescentou algumas linhas na minha sensibilidade e me ensinou algumas coisas que posso aplicar às demais sementes que restaram e que esperam serem plantadas (agora num período com mais chuva e sol ameno).

Lidar com outros seres, sejam animais de estimação, sejam as plantas da nossa casa, amplia nossa percepção de mundo, se estamos abertas a isso. Lendo e ouvindo sobre o pensamento indígena, especialmente o Yanomami, sinto que a familiaridade e a sabedoria que eu tinha quando crianças com esses seres e que foi afastada ou fragmentada pela vida adulta, é novamente "autorizada". A crise climática vai nos exigir uma nova ética, uma que inclua um retorno a esse tipo de vivência (que inclua um resultado de alimentação do corpo físico, também), que resgate saberes antigos das sementes ignoradas pelo latifúndio, que residiam nas memórias das nossas avós, que resgate a sabedoria de povos que estão há muito tempo preservando essas sementes e a arte de lidar com elas, a arte de conviver com outros seres como seres tão importantes como nós mesmos, de um outro modo, um menos utilitário. É uma transformação epistemológica em direção a uma outra ética. Em outras palavras, saber conhecer de um jeito que não nos destrua a todos e quem sabe, salve a maioria dos seres desse cataclisma provocado por nós (ou alguns de nós).

Essa foi a lição que tirei das espiguinhas de milho. Seguem as fotos.








Ps. Chamo insistentemente de espiguinhas, porque elas não são daquele tipo do milho amarelo/branco que não crescem muito.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Pecado Original

Sete seriguelas: cinco verdes, uma de vez e uma última madura



Se Gênesis tivesse sido escrito pela minha mãe, o fruto proibido jamais seria uma maçã ou similar. Que mal pode haver em uma fruta comestível? Pera, uva, bacuri, goiaba, guabiraba e até pequi, nenhuma delas haveria de ser o fruto proibido. Eu, habitante do jardim, com meus irmãos, jamais reclamaríamos de não podermos comer quaisquer daquelas frutas. O que nos custaria a imortalidade e a eterna distância do amor divino seria, isso sim, o acompanhamento da eventual fruta: o sal e a pimenta. Sim, amigos... aquela manga verde temperada, aquela seriguela com sal e pimenta, ou só com sal, isso sim provocaria a fúria da manda-chuva do jardim. O medo imposto em mim de comer a mistura proibida, até uma certa idade, era o equivalente ao temor de ter que sofrer as consequências de uma mordida no fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Dá o que pensar esse medo de que adquiríssemos uma gastrite numa época tão dura, nos idos anos 1990. Então, na minha cabeça infantil, manga com sal e pimenta senão era o maior, era um dos maiores pecados no nosso jardim do éden.

Daí que hoje, estando em casa de mamãe, peguei uma seriguela que estava ali no saco para amadurecer. Aproveitei que estava sozinha e decidi pegar a pimenta-do-reino e o sal para saborear a fruta. “Ora, já comi manga temperada em salada de self-service dezenas de vezes!”. Preparei o pires, misturei com o dedo indicador o branco e o preto; mergulhei a seriguela mordida lá. Comi a frutinha toda. Uma delícia. A sensação engraçada de burlar uma regra doméstica não tinha mais peso, já tenho mais de trinta anos, mas a agitação que se deu em mim para realizar um feito tão simples, em vez disso, provocou uma saudade do desemparo da infância, em que as regras mais inusitadas se fazem necessário, uma sensação de arrependimento de não ter sido uma criança desobediente, um imenso carinho pelo cuidado da minha mãe e uma alegriazinha de desafiar, novamente, meu paladar adulto acostumado. E um certo alívio de não ter havido nenhuma expulsão com direito a anjo com espada de fogo[1]. Logo, convido quem está lendo esse texto, ao pecado original com sua fruta favorita: sabor, ardor, amor.[2]






[1] Certamente as imagens de “Belas maldições”, série da Amazon baseada em homônimo do Neil Gaiman, estão em mente, avivando a metáfora bíblica.
[2] Referência ao musical “Ardor, Amor”, que esteve em cartaz em Teresina, no mês de Maio de 2019.

segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Há uma raiva de fundo


Há uma raiva de fundo
Como o clarão de um incêndio ao horizonte
A substituir a aquosa angustia
Lembra um sol velho
Que já se ergueu e se deitou tantas vezes
E que faz uma última aparição.



sexta-feira, 30 de agosto de 2019

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