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segunda-feira, 19 de junho de 2023

Laura Gilpin: poesia

Como alguém que gosta de poesia, a emoção que ela traz, é sempre algo que me captura primeiro. A ironia dessa constatação, é ter entendido que isso é a coisa mais difícil do mundo: encontrar uma poesia que caiba exatamente na minha capacidade de me comover e empatizar com os versos. Além disso, eu nunca tive pressa para buscar essas pequenas preciosidades. Mas, ontem, no lugar menos propício, eu ganhei esse presente: (seguem 3 versões: em inglês, português e em quadrinho)


O bezerro de duas cabeças 

Amanhã, quando os rapazes da fazenda encontrarem essa aberração da natureza,
Eles vão enrolar seu corpo em um jornal e carregá-la para um museu.
Mas hoje à noite ela está viva e com sua mãe, no norte do pasto.

É uma perfeita noite de verão: a lua nascendo sobre o pomar,
o vento sobre a grama,
e como ela admira o céu
existem duas vezes mais estrelas que o normal.

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Two-Headed Calf
Laura Gilpin

Tomorrow when the farm boys find this
freak of nature, they will wrap his body
in newspaper and carry him to the museum.

But tonight he is alive and in the north
field with his mother. It is a perfect
summer evening: the moon rising over
the orchard, the wind in the grass. And
as he stares into the sky, there are
twice as many stars as usual.

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Essa imagem ilustra o poema acima. Há um bezerrinho deitado no campo e sua mãe próxima. A lua no céu e estrelas nos olhos negros do filhote.
Poema de Laura Gilpin e Desenho de @adamtotscomix

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Ps. Talvez eu tenha chorado lendo esse poema. Pensei muitas coisas e tive que falar dela para algumas pessoas da minha família que tem alguma paciência com essas minhas coisas, rs. Eu a encontrei em um meme artístico do twitter, ontem. 

Eu fiz algumas escolhas pessoais nessa tradução, sempre pensando no original. Depois eu vi que existem outras em português, claro, que essa postagem seja pelo menos uma placa de indicação para a obra da autora. =)

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Livro: O corpo dos meus sonhos e outros poemas - Lara Matos

Esses dias minha amiga Lara organizou seus poemas em um livro (editora Entretrópicos) que tratei de obter, assim que aparecesse algum dinheiro e, bom, apareceu. Não que seja caro o livro, 20 reais está um ótimo valor, acessível, mesmo que você tenha que contar as moedas, não são tantas assim e a leitura vale muito a pena.

Como mencionei outro dia no twitter, Lara escreveu um livro de amor que não é romântico e muito sintonizado com transmutações afetivas geracionais, eu diria. Se o movimento feminista luta pela emancipação em vários aspectos sociais, eu diria que o resultado emocional e psicológico de suas conquistas e perdas pode ser percebido de modo bastante privilegiado nas escritoras que captam o espírito do tempo que coube ao movimento nas suas várias ondas, mesmo que não seja explicitamente a eles vinculadas. O que não é o caso da Lara Matos, é claro, tendo em vista que além de poeta é especialista em direitos humanos e mestranda em sociologia. 

Mas os versos da Lara não se resumem a isso, é claro. Não vou cometer o mesmo erro de reduzir a autora a um tema, ao tema "feminino" ou agora "feminista", erro que gerações e gerações de "críticos" de autoras mulheres, como Sylvia Plath, poeta lembrada por Lara, aliás, continuam a cometer. Que o digam seus metapoemas, poemas que tratam de poemas, que nos dão uma pausa enganadora.

Se o sofrimento nenhum um pouco disfarçado ou embelezado do seu eu-lírico parece lembrar o sofrimento de todas as mulheres, em todos os livros e mesmo no dia-a-dia, é melhor ler de novo, porque esse sofrimento é localizado. Não é qualquer corpo, é um corpo de mulher negra de um país que fala português. Se vire aí no mapa e viaje nas possibilidades. 

Gosto particularmente da acidez com que desdenha dos homens. Não parece que é qualquer homem, parece um homem típico de algum lugar que o eu-lírico foi obrigada a estar. Gosto que também como os momentos de felicidade que encontra, se com algum deles ou sozinha, o eu-lírico é bastante econômico em deixar revelar esse estado, como que para não agourarem ou para deixa bem evidente que sua vida é mais que isso. Bem mais. E quando o amor surge, é em meio ao mormaço.

É isso. O belo livro da Lara Matos é um oferecimento às leitoras, especialmente aquelas com raiva sub representada das províncias de todos os tamanhos deste país, continente, quiçá mais. Um dobrar-se e desdobra-se de um corpo que se alterna entre ruínas e êxtase.


EXPOSIÇÃO

Nunca tive pseudônimos, sequer
Eus- líricos falando por mim
Carregando minha música em voz falsa,
É minha cara que exibo para os tapas
Que pode muito bem ser aplausos
Meu corpo é todo verso sem saída.

O livro tem a capa de kraft com o título e nome da autora e alguns arabescos




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