sábado, 20 de fevereiro de 2016

uma página de desamor à cidade no meu diário

"Os dias passam serenamente vazios..." H. Dobal, sobre Teresina

Esse vazio que Dobal menciona, sinto o peso dele desde a infância, forçando a intensidade do meu eu interior como se dependesse exclusivamente de mim preencher a ausência exterior vazio externo e poderoso. É um vazio de cor suave nesse instante, que não se altera, sua única intenção é não ter intenção. Não... Na verdade sua intenção é fazer vingar o que há de obscuro em meu país interior, me tornando parte de sua unidade vazia. O que há de mais vivamente intensamente colorido em mim sufoca, não encontra expressão; transborda numa massa amorfa e me afoga sua possuidora.

O vazio dessa cidade labuta sem pressa, tingindo vagarosamente, definitivamente, cada ser que o destino a fatalidade fez que aqui permanecesse, seja  por nascimento ou por outro motivo qualquer. Um existência monocromática, da qual mal dão contas os viventes, ou quase-viventes -o vazio agia enquanto essa página era escrita. São quase-inocentes de tudo isso. Quase.
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Teresina é esse deserto amarelo. Não de um amarelo suave, como o das chananas, mas de um amarelo feio e pegajoso. Some-se a isso o fato de ser bruta e monolítica. Cidade que expurga quem ousa alterar seu tipo de eternidade. Aliás, Teresina é uma cidade de eternidades. Eternidade vazia. Eternidade seca. Eternidade oca. Eternamente a negar seus vícios. Eternamente isenta. É eterna morada de vilanias esquecidas. Além de eterna morada de pássaros pardais, com seu marrom e cinza e negro e sinceramente desconfio que sejam de fato seus únicos viventes. Eternidade plana. Teresina também é labiríntica, mas labirinto de um só corredor e que não chega a lugar algum. É linha do horizonte infinita que não comove, que não causa vertigem, mas que deve gozar na indiferença. Talvez seja isso mesmo e eu tenha descoberto seu maior segredo: o gozo na indiferença. Inclusive, ainda sobre a linha do horizonte, é essa linha do horizonte que faz a cidade pairar sobre um certo tipo de infinito. O tipo de infinito sobre o qual ela não vai fazer nada a respeito, não vai dizer nada a respeito, porque é exatamente isso o que ela faz conosco: nada, absolutamente nada. E aí está mais um segredo revelado da cidade: a aspiração ao nada é a maior ambição de uma cidade-deserto como a que nasci. E sobreviva quem puder a ela, porque viver, viver, aqui não é território para isso.

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