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domingo, 25 de março de 2018

Movimento Aquático


A chuva tem o efeito de dar um tema único a uma paisagem confusa, quando elementos, ainda que próximos, não costumam apresentar um equilíbrio, uma harmonia entre si: ela passa a funcionar discretamente como tela para uma pintura que surge, ou como um enquadramento que direciona o olhar do fotógrafo. Mais que isso: ela sugere foz aos sentimentos das pessoas sensíveis que se perdem sob um excesso de estímulos dos seus arredores. O rio que se materializa dentro de si lhe traz alguma paz, pois de veios intermináveis vindos de tantas direções possíveis, passa ao tema único, que agora pode ser decifrado. Rio que conduz pensamentos e sensações, cuja materialização não cabe ainda antecipar o mar.



quinta-feira, 8 de março de 2018

Oito de março: dicas

Lou Andreas- Salomé, Carolina de Jesus e Alice Walker. Nomes imensos e ainda por serem devidamente conhecidos e reconhecidos.

A primeira, Lou Andreas- Salomé (1861-1937), psicanalista, romancista, filósofa e poeta. Interlocutora de muitos e inspiração para outros tantos, como Nietzsche, Rilke e Freud. Teve um filme sobre sua vida lançado ano em 2016 e que nos ajuda a compreender um pouco dessa brilhante mulher, que viveu o mundo de modo tão intenso. Assisti-lo não deixa de ser um exercício para que comecemos a tirá-la da sombra dos homens ao seu redor, colocando-a ao lado deles- no mínimo. Em português, há uma pequena biografia lançada pela LP&M pocket.



A segunda, Carolina de Jesus, é autora do primeiro livro que li numa das vezes que consegui participar do Leia Mulheres de Teresina. Quarto de despejo é sua obra mais conhecida, um marco na literatura brasileira, que apresenta, com crueza e realidade, o dia a dia numa favela brasileira na década de 1950, em forma de diário, com uma linguagem bastante característica. Testemunha que vive na pele de mulher negra e pobre, o esquecimento social e a luta para uma existência que lhe permita perceber em si uma dignidade inimaginada pelo meio literário da época. É daquelas leituras obrigatórias para nossa formação. Aqui embaixo segue um curta de 14 minutinhos sobre a autora:


A última, Alice Walker, escreveu o livro mundialmente aclamado "A cor púrpura" (1982), filmado por Steven Spielberg e estrelado por Whoopi Goldberg, Danny Glover e Oprah Winfrey. O livro, que é um romance epistolar, trata da separação de duas irmãs que se perdem ao longo de suas vidas, pelas violências que as acompanham desde o ambiente familiar. É uma obra chocante, especialmente em sua primeira metade e que trata da violência contra as mulheres, de misoginia, racismo e colonialismo. O livro ainda nos brinda com um ousado e inesperado casal de mulheres, que se unem para lidar com todas essas dores e aprender a criar alegrias no meio de tudo aquilo. Outro livro imprescindível. O canal "Curta!" já apresentou o episódio da série "Impressões do Mundo" com a autora. Se você puder, vale a pena conferir.












domingo, 4 de setembro de 2016

Da vivência e do caráter (parte 1)

Sou grande fã do mitólogo Joseph Campbell. Leio como uma amante e curiosa, não como uma especialista. Há uma coleção sobre mitologia que ele escreveu chamada "As máscaras de Deus", que estou por completar. São 4 volumes: mitologia primitiva, mitologia oriental, mitologia ocidental e mitologia criativa. Tenho o segundo e o quarto. Esse quarto, o mitologia criativa, tem tido um lugar especial no meu coração. Ele fala sobre o cristianismo primitivo e de como ele se relacionava com várias religiões tidas como pagãs; sobre o Amor romântico; faz uma análise maravilhosa do Guernica, do Picasso; do Ulisses, do Joyce, dentre outras coisas lindas. Ainda não terminei, porque é daquelas leituras que exigem entrega e eu ando me entregando a ela a prestações (às vezes por vontade, outras, por circunstâncias externas).

Hoje eu queria compartilhar um trecho em que o Campbell cita o Schopenhauer, provavelmente o filósofo mais mencionado por ele. O trecho fala sobre a vivência e a noção de caráter:

"O caráter inato, ou, como Schopenhauer o denomina, o caráter inteligível, é desenvolvido apenas gradual e imperfeitamente pelas circunstâncias; e que surge disso, ele chama de caráter empírico (experienciado ou observado). Nossos próximos, pela observação desse caráter empírico, muitas vezes se tornam mais conscientes do que nós mesmos da personalidade inata inteligível que secretamente conforma as nossas vidas. Temos que descobrir pela experiência o que somos, queremos e podemos fazer e 'antes disso', afirma Schopenhauer, 'não temos caráter, somos ignorantes de nós mesmos e temos, frequentemente, que ser devolvidos para o nosso caminho a duros golpes exteriores. Entretanto, quando finalmente aprendemos, adquirimos o que o mundo chama de 'caráter'- quer dizer, caráter adquirido. E esse, em resumo, não é nem mais nem menos do que o mais completo conhecimento possível da nossa individualidade." (2010,p. 45)

O que eu quis dizer com esse excerto? É simples: para o autoconhecimento, aproveite o dia (carpe diem). Só assim vai descobrir quem é essa pessoa que você é. Trabalhar a potência pela vivência. Acontece que muitos de nós assumimos um "caráter" sugerido e não um caráter vivido. A diferença está em se assumir ou não no mundo.

Numa postagem posterior volto a esse assunto com a ajuda da Branca de Neve.

;)

 





quarta-feira, 10 de agosto de 2016

O medo, a estrada e o muro

O medo não é só o alerta quanto a uma situação de perigo. O medo é um indicador da nossa potência. Um sinal de que ela tá acumulando muita energia que não está sendo aproveitada. E como o medo é direcionado, ele aponta o caminho de liberar a potência e transmutar. Quando ele vem, é porque aquele momento, ou pensamento, ou emoção tocou em algo que nos faria dar um salto no desconhecido da potência.

E é por meio desses saltos que a vida se apresenta de maneira única. Ultrapassando barreiras de tempo e espaço numa afirmação de si.

Nosso comportamento natural é permitir que os medos se transformem em muros que nos mantêm seguros, em limites de estradas já bem mapeadas. Muros seguros que nos impede de ver além do muro que também somos nós. Limites que treinam nosso olhar para o adiante supostamente já conhecido (por isso, seguro, ainda que nos maltrate), quando existem trilhas e veredas em profusão a serem percorridas e mesmo construídas a partir dos nossos passos.

O medo também é a intensa percepção do além muro e de que os limites da estrada conhecida não são obstáculos intransponíveis. A estrada, que um dia foi uma trilha que deu certo para a primeira de nós, (seja lá o que tenha sido esse "dar certo") e que, por segurança, por adestramento, por comodidade, por preguiça ou por fé sincera, a maioria de nós continuou a seguir.

E tanta infelicidade, tanta insatisfação, tanto medo surgem por resultado desse apenas continuar, já que aquela estrada não era sua e nem aquele muro era tão seu como você imaginava. Quem encontra sua trilha e tem coragem e possibilidade de segui-la, pode até vê-la transformada em estrada, mas ainda assim será sua estrada; também pode-se construir algum muro (eles podem ser úteis, por um tempo), um muro baixo, com vista para o outro lado. Mas daí ambos seriam potência transmutada em vida, compondo o cenário maior da paisagem, com muitos territórios a serem provocados em explosões de suas potências coloridas.

Já depois de terminar o texto, eu lembrei de um poema do Mario Quintana que eu relia muito, em uma determinada época da minha vida. Por algum motivo que eu desconheço, parei de relê-lo e segui por outros versos. Fala de um caminho velhinho, um caminho esquecido. O caminho dele me parece uma das minhas trilhas. Porque as trilhas podem ser caminhos já tentados e abandonados, caminhos já descobertos em outros tempos e esquecidos ou caminhos que nós mesmos começamos a trilhar e, que, pelos mais diversos motivos, largamos. Quintana me fez lembrar que essas trilhas adormecem, algumas podem até ficar em "estado de morte" se não tem mais seu caminhante. Mas sempre pode acontecer de uma trilha já abandonada por alguém que decidiu que era mais sereno seguir a "estrada de todos", sirva de incentivo para outros caminhantes percorrerem aquele caminho e criarem novas retas e voltas. Quem sabe a gente não esbarra com uma dessas depois que arriscarmos pôr o pé fora daquela estrada.

Tem uns 7 anos que essa foto aí foi tirada por uma amiga minha, numa das praias de São Luis. É meu eu de 7 anos atrás numa trilha, depois de tomar uma importante decisão.

Caminho (Mario Quintana)

Era um caminho que de tão velho, minha filha,
já nem mais sabia aonde ia...
Era um caminho
velhinho,
perdido...
Não havia traços
de passos no dia
em que por acaso o descobri:
pedras e urzes iam cobrindo tudo.
O caminho agonizava, morria
sozinho...
Eu vi...
Porque são os passos que fazem os caminhos!

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